Editorial – António Rochette Cordeiro
No âmbito da celebração dos 25 anos do CEIS20 e do Colóquio CEIS20 – 25 anos: história, perspectivas e práticas na interdisciplinaridade, António Rochette Cordeiro, anterior Coordenador Científico do CEIS20, assina o Editorial de fevereiro. Este depoimento dá continuidade a um ciclo de editoriais subordinados ao tema da Interdisciplinaridade no Centro assinados pelos seus anteriores Coordenadores Científicos.
Editorial por António Rochette Cordeiro
A função como Coordenador Científico do CEIS20, iniciada no ano de 2016, obrigou-me ao desafio de exponenciar o papel da interdisciplinaridade num centro de investigação que funcionava, desde a sua génese, muito numa lógica disciplinar, ou, como António Pedro Pita o refere, em “áreas temáticas especializadas”. Os diferentes Grupos de investigação associados a áreas específicas, refletiam, no essencial, uma produção científica multidisciplinar, e só muito raramente interdisciplinar. Do mesmo modo, também a revista Estudos do Século XX, organizada por números temáticos pelos Grupos de investigação, e o próprio Programa de Doutoramento em Estudos Contemporâneos, acabavam por refletir essa mesma dinâmica. Aliás, esta era a observação plasmada nos Relatórios dos vários painéis de avaliação, que referiam inequivocamente não existirem grandes relações entre os diferentes Grupos. Nesse contexto, e muito pelo que me tinha levado a procurar a minha integração no CEIS20 – por força de uma formação académica numa ciência onde a visão integradora e holística se assumem como marcas distintivas –, tal motivação acabou por se assumir como uma pedra basilar para os desafios colocados à visão estratégica do Centro para os anos que se seguiriam.
A tentativa já desenvolvida pela anterior Coordenação Científica de procurar a concretização futura de uma linha de investigação interdisciplinar no Centro, na sequência daquela leitura sobre a falta de relacionamento entre os Grupos de investigação, teve como base dois Programas de Investigação definidos em 2013: “Dois séculos de liberalismo, 1820-2020: formas de estado, movimentos sociais, dispositivos de subjetivação” e “Mobilidades: indivíduos e ideias entre lugares”.
Porém, cinco anos mais tarde, a constatação de que pouco tinha mudado, levou à definição de uma nova estratégia de mobilização amplamente discutida no seio do CEIS20, e que mesmo mantendo os dois anteriores Programas de Investigação, procurava através de Eixos Interdisciplinares – “Desigualdades, Fronteiras e Mobilidades”; “Media e Sociedade na era pós-digital”; “Democracia, tempo presente e memória das ditaduras”; e “Teoria em humanidades, artes, ciências sociais e tecnologias sociais” – um maior incremento das relações de pesquisa entre os investigadores de diferentes áreas temáticas que integravam o CEIS20. “Ferramentas de Investigação” traduzidas através de Diálogos Interdisciplinares, tais como – Momento CEIS20, Projetos em Diálogo, Encontro de Jovens Investigadores, Oficina de Ideias – deveriam assumir, neste contexto, um processo catalisador na tão necessária relação entre Grupos e respetivos investigadores. Este incentivo das relações científicas entre as áreas de conhecimento que integravam o Centro, tornou-se no objetivo primordial (algo que tinha já sido tentado anteriormente), de modo a possibilitar uma reconfiguração das próprias áreas disciplinares.
Numa primeira fase, procurou-se um alargamento das áreas do conhecimento através da implementação da rede de parcerias internacionais, que resultou no aumento de frequência do Programa de Doutoramento em Estudos Contemporâneos. Também daqui provieram diferentes dissertações de temáticas interdisciplinares orientadas por investigadores de distintas áreas, assim como a implementação de projetos internacionais interdisciplinares.
Um outro ensaio na procura de incentivar os estudos interdisciplinares foi a comemoração do vigésimo aniversário do Centro em finais de 2018, e o desafio colocado aos investigadores do CEIS20 da realização em 10 dias de um conjunto de congressos, seminários, encontros internacionais (num total de 11 eventos) que culminassem no Congresso Internacional “Border Crossings. Territórios e Fronteiras em Investigação”. Embora alguns dos eventos mantivessem uma lógica disciplinar, outros já seguiram a visão pretendida, daqui resultando várias obras que revelaram já uma evolução do tão desejado pensamento interdisciplinar do CEIS20.
No entanto, um facto era na altura notório: a investigação necessita de recursos, algo que o financiamento do CEIS20 não proporcionava. A opção de oferecer recursos aos investigadores para o período de avaliação seguinte, foi uma decisão assumida como contraditória, já que esta implicava, indiretamente, uma avaliação do centro não condicente com os desejos dos seus responsáveis e investigadores. Porém, a assunção de que, “às vezes é preciso dar um passo atrás, para depois dar dois adiante”, tornou-se difícil, mas consciente. O futuro da investigação do CEIS20 assim o exigia e, como se tem conhecimento, foi conseguido um significativo reforço financeiro para o novo período de atividade.
Muito brevemente vamos ter conhecimento se estas decisões, sobre os caminhos delineados e trilhados pelo CEIS20 e pelos seus investigadores, foram as melhores. Tenho a certeza que a avaliação vai refletir o tão desejado desfecho, mesmo tendo consciência de que as difíceis opções tomadas poderiam ter levado a um incremento ainda maior da investigação interdisciplinar e transdisciplinar.
Apenas um breve pensamento me parece ser exigido após o período de afastamento a que me obriguei, e no decorrer do qual fui desenvolvendo algumas reflexões sobre a necessidade crescente da investigação interdisciplinar (e também transdisciplinar) no CEIS20. Se propositadamente não me pronuncio sobre a visão que vai ser a linha de ação do Centro, não posso deixar de referir que o amadurecimento que um investigador necessita para esta abordagem, exige um aprofundamento da própria investigação disciplinar original, capacitando assim a promoção do enriquecimento das práticas interdisciplinares.
CEIS20, 27 de fevereiro de 2024
António Rochette Cordeiro
(Professor Auxiliar na Universidade de Coimbra. Investigador integrado do CEIS20)