Má nutrição em idade escolar pode ter provocado uma diferença de altura de 20 centímetros entre nações, conclui estudo com participação da FCTUC
Uma equipa da Universidade de Coimbra (UC), liderada por Cristina Padez, participou num estudo que avaliou a altura e o peso de crianças e adolescentes em idade escolar em todo o mundo, bem como o Índice de Massa Corporal (IMC), publicado este mês na revista The Lancet.
Liderado pelo Imperial College London, o estudo, que utilizou dados de 65 milhões de crianças dos 5 aos 19 anos de 193 países, conclui que a má nutrição em idade escolar pode ser responsável por uma diferença média de altura de 20 centímetros entre nações. A altura e o peso das crianças em idade escolar são indicadores da sua saúde e qualidade da sua dieta e preditores da saúde e desenvolvimento ao longo da vida.
«Ter uma estatura baixa para a idade e pouco peso para a estatura aumenta o risco de morbilidade e mortalidade, está associado a um baixo desenvolvimento cognitivo, menor probabilidade de uma boa performance escolar e consequentemente uma baixa produtividade profissional na vida adulta. Um IMC elevado, muito peso em relação à estatura, está associado a um risco elevado de incapacidade física, morte prematura, atrasos cognitivos e deficiências no grau de instrução», explica Cristina Padez, do Centro de Investigação em Antropologia e Saúde (CIAS), da Faculdade de Ciências e Tecnologia a Universidade de Coimbra (FCTUC).
A análise, que relata dados de 1985 a 2019, revela que as nações com os jovens de 19 anos mais altos em 2019 situavam-se no noroeste e centro da Europa e incluíam a Holanda, Montenegro, Dinamarca e Islândia.
Os países com os jovens mais baixos em 2019 estavam principalmente no sul e sudeste da Ásia, América Latina e África oriental, incluindo Timor-Leste, Papua Nova Guiné, Guatemala e Bangladesh.
Os maiores crescimentos na altura média das crianças durante o período analisado foram observados na China e Coreia do Sul. Por exemplo, rapazes de 19 anos na China em 2019 eram 8 cm mais altos do que em 1985, com a sua classificação global a mudar da posição 150º em 1985 para 65º em 2019.
Em Portugal, no que respeita à altura, aos 5 anos de idade as meninas passam do lugar 38º para o lugar 70º e os meninos do 49º para o 77º. Ou seja, «afastam-se dos países “mais” altos. Aos 19 anos de idade as raparigas passam do lugar 88º para o 90º e os rapazes do 128º para o 87º. Isto significa que, no período de 1985 a 2019, quem mostra uma evolução positiva são apenas os rapazes de 19 anos de idade, que se aproximam dos países com estatura mais elevada», refere Cristina Padez.
«Bastante problemático é o facto de, no período 1985-2019, aos 5 anos as crianças portuguesas se terem afastado dos países com “maior” estatura», afirma a especialista, referindo que isso significa que, «possivelmente tiveram lugar carências nutricionais, especialmente de vitaminas e minerais, que não permitiram um crescimento adequado. Isto indica uma deterioração das condições de vida das crianças com repercussões graves para o seu desenvolvimento futuro enquanto cidadãos inseridos no mercado de trabalho».
Quanto à relação peso-estatura (IMC), aos 5 anos de idade as meninas passam do lugar 40º para o 89º e os meninos do 51º para o 117º, isto é, distanciam-se dos países com “mais peso”, o que é muito positivo. Aos 19 anos de idade, raparigas e rapazes passam, respetivamente, de 117º para 157º e 58º para 100º.
De uma forma global, os resultados referentes a Portugal permitem concluir que «apesar dos bons resultados relativamente aos valores de obesidade, no caso da estatura das crianças aos 5 anos, estas parecem não estarem a crescer adequadamente, já que se afastam cada vez mais dos grupos de maior estatura. Isto é muito preocupante pelas consequências na saúde das crianças, no curto e a longo prazo. Possivelmente, as condições de vida na infância têm-se deteriorado com uma alimentação deficiente, o que estará a comprometer um adequado desenvolvimento físico destas crianças, com consequências para a sua saúde e grandes repercussões na vida adulta».
O artigo científico pode ser consultado em: https://www.thelancet.com/journals/lancet/article/PIIS0140-6736(20)31859-6/fulltext